Ahhhh a vida a bordo… Tudo parece perfeito, as áreas do navio são lindas e muito limpas, a comida é maravilhosa, a diversão nunca pára, o atendimento é ótimo na maioria das vezes, e os tripulantes são felizes, ganham bem, falam vários idiomas e viajam o mundo. Ops, esse é o mundo do passageiro, a visão dos passageiros (a maioria) sobre nós tripulantes é esta!
Vem pra realidade da vida a bordo….
Não que seja mentira, ou que não tenhamos uma vida legal. Mas vamos descer um pouquinho nos Decks, e voltar aqui pra vida real, no deck 0. Onde o bicho pega.
As diversas horas de trabalho, muitas vezes em pé, dependendo da posição, coloca o nosso corpo em uma situação de risco às vezes. Nós não temos o mesmo cuidado que em casa e a correria é tão grande que esquecemos de nos cuidar.
Como Snack Steward, eu sempre trabalhava em pé na maior parte das 11h diárias, quando chegava à noite, os pés e as pernas estavam latejando, e só queriam se livrar dos malditos safety shoes.
Quando eu tinha um pouco mais de um mês a bordo, tive um sério problema. Para alguns pode ser nojento ou terem vergonha, mas eu vou falar. Unha encravada. Não deve ser novidade pra quem está há muito tempo na vida a bordo. Mas eu lhes digo, evite ao máximo ter esse tipo de problema.
Uma pedra do sapato… Ops, uma unha encravada
Eu já sentia as dores na unha há alguns dias, mas achei que cortando resolveria. Cortei errado. A unha já havia entrado na carne, e quando cortei, quebrei no meio, deixando metade lá dentro, uma coisa que não percebi, pois momentaneamente resolveu o problema. Com o passar dos dias, foi inflamando e a dor voltou e, dessa vez, mais forte. Eu achei que passaria, e continuei trabalhando até que não aguentava mais. Resolvi ir ao doctor de bordo, mas não sei se era melhor ter ficado como estava. Nessa parte, é que a Thais entra, e um dos porquês de ela ter se tornado tão importante.
O doctor me fez uma consulta e pediu para voltar na manhã seguinte para resolver o problema. Na manhã seguinte, após o turno de trabalho, fui ao doctor para resolver de vez. Me pediu para aguardar um pouco na pequena recepção, onde tinha a enfermeira peruana, que odiava quando os brasileiros tentavam falar em espanhol com ela.
Depois de alguns minutos, a Thais me chamou para a salinha de cirurgia onde estava quase tudo pronto. Deitei na maca e o doutor chegou, eu já entendia italiano, mas não o suficiente pra entender o que ele dizia pra Thais. Eu sempre perguntava pra ela o que ele havia dito e sempre pedia que dissesse a ele pra não arrancar a unha toda.
Quando ele começou o processo, achei estranho a falta de remédio ou qualquer anestésico, mas ele era o doutor e saberia o que fazer, talvez da pior forma, mas saberia.
– Arrrrrghhh! – Foi o único som que conseguia fazer quando ele começou. Era impossível fazer aquilo sem anestesia, ele estava puxando a parte da unha inflamada a seco. Eu segurava na mão da Thais e gritava de dor, pedindo pra não arrancar tudo. Foi o dia em que mais senti dor na minha vida, foi cruel. Ele continuou todo o processo, e eu já estava a ponto de chorar. Pedia que terminasse logo, e a Thais morrendo de dó, tentava me acalmar. E acho que ele só não arrancou tudo, por que ela estava lá.
Quando acabou a cirurgia, eu não queria mais levantar da maca. Eles me deram três dias de medical off inicialmente, isso significava que eu teria de ficar três dias confinado na cabine. Sair, só era permitido se fosse até o Crew Mess e corredores comuns, nada de ir ao Crew Bar, ou sair do navio para visitar as cidades. O que foi uma pena, pois era justo no cruzeiro de overnight em Lisboa, um dos que eu mais gostava. Os dias dentro da cabine foram bons para mim, para a minha recuperação e para descansar também. Passava o dia vendo tv, estudando italiano, ouvindo música no canal RTL 102.5 e recebendo visita de amigos como o Alan e o Jhonata, e a italiana que sempre que podia, passava pra me ver.
A Thais foi quem mais me ajudou nestes dias de off. Ela quem fazia os curativos no meu dedo, e até mesmo me dava mais medicamentos e utensílios para que eu fizesse sozinho, era como uma irmã a bordo.
Após cinco dias eu retornei ao trabalho no buffet, ainda doía, mas estava melhor. Me sentia estranho no buffet, parecia que algo havia mudado na decoração, não sei o que, só sei que estava diferente e era diferente voltar à rotina. Trabalhava com cuidado pra não inflamar de novo, pois não queria ver o doutor tão cedo. A melhor coisa de tudo isso, é que agora eu poderia ir ao Crew Bar, já que as Crew Party estavam cada vez melhores, poderia sair do navio para conhecer as cidades e visitar os lugares que eu gostava.
Tente evitar ao máximo suas idas ao doctor a bordo, eles têm um tratamento ruim, alguns são antigos médicos do exército e até mesmo trabalharam durante algum pequeno conflito ou outro, assim eles contavam a história deles, mas se precisarem ir ao médico, que tenha alguém lá como a Thais foi pra mim no Costa Mediterranea.
E aí, tá curtindo os relatos da vida a bordo? Conta pra gente aqui nos comentários! Se quiser ver mais relatos e dicas sobre o trabalho em navio de cruzeiros, siga as nossas redes sociais: Instagram, Facebook, Pinterest e YouTube.
Veja também:
0 comentários